terça-feira, 17 de agosto de 2010

Florentina e a Casa Civil

Em 2002, um candidato a deputado federal chamado Rôla rodou as marotas correntes de email de firma, naqueles gloriosos tempos que ser cool na internet era ser administrador de comunidade no mIrc e não ser vlogueiro, analista de mídias sociais e atacar de dj nas horas vagas. O senhor, vendedor de rua lá do centro de minha Aracaju, acabou se tornando em uma das sensações nacionais do sempre caricato e tradicional panteão de candidatos brasileiros que tentam ganhar votos marcando presença de maneira original nos escassos 5 segundos que tem direito no horário eleitoral.


Com o slogan "é Rôla nelas", mais criativo que 93% das piadas faladas por humoristas stand-ups amigos do cara do Jacaré Banguela, o senhor acabou aparecendo no Fantástico, em uma época que o show da vida ainda reunia a família brasileira no sofá da casa aos domingos a noite. Foi eleito? Não foi. Eu me lembro dele? Sim. Sei em que deputado federal meu pai votou naquele ano (quando eu ainda não tinha idade para votar)? Não.

Rôla era mais um dos muitos candidatos que ao troco de alimentar uma utópica cogitação de se transformar em representante popular no congresso deste país, se prestam, direta ou indiretamente, a tirar uma risada do eleitor e abrilhantar o enfadonho trecho do horário eleitoral reservado a deputados e vereadores. Tomado por gente que gasta mais tempo falando em quem apoia para os cargos majoritários, tais momentos são os principais agentes que fazem com que minha mãe se irrite quando aquela voz que, ao falar dos filmes da Sessão da Tarde se empolga pra valer com uma galera da pesada, nestes momentos solta em tom sério e seco o tradicional "interrompemos nossa programação...".

Rôla era mais um dos candidatos do time de figurões que fazem do horário político um programa legal.

Nesta terça começaram os reclames eleitoreiros de 2010 e, como já esperava, reapareceu um tipinho de pessoa que tem na superficialidade a sua principal parceira: o inteligentão decepcionado. Pior, agora com uma novo local para divulgar seus pioneiros pontos de vistas, as redes sociais.

É fácil achar um desses. Abra agora seu perfil no Facebook ou no Twitter, e confira rapidinho a quantidade de gente que do nada se interessou por política e reclamou que o Brasil é uma vergonha por deixar que o Tiririca fosse candidato de alguma coisa. Muito cuidado com estas figuras. Dotados de conhecimentos políticos de fazer o Metro parecer a Piauí, eles são capazes de passar 4h30 falando mal da Dilma em uma mesa de bar, mesmo sem saber o que é o Ministério da Casa Civil.

Estas mesmas figuras que reclamam do Tiririca, que, como a maioria disparada de candidatos do tipo, não deverá ser eleito, alimentam o tradicional complexo de inferioridade aliado a tudo que é original do Brasil. Assim, se permeia uma sensação de "isso só existe aqui, que vergonha", quando nem devem se lembrar (ou saber), que a atriz pornô italo-hungara Cicciolina foi deputada eleita na Itália e que a Sarah Palin, uma republicana de ultra-direita, defensora do criacionismo (Adão e Eva, filho), dois anos atrás era candidata a vice em uma chapa para a presidência do EUA. Isso pra não falar do Schwarzenegger.

E o abestado só querendo alimentar a família dele!

Pois bem, sou do pensamento que estas figuras icônicas, como o autor de Florentina, são fundamentais para a manutenção do processo eleitoral brasileiro. São eles que puxam a atenção do público para o horário eleitoral, que pode ser dispersada para quem realmente esta ali para mostrar alguma coisa diferente, o que - como eu, você e até o inteligentão sabe - são raros. Digo mais, são eles que te distraem do mar de lugares comuns de propostas que soavam originais lá em 1913. Propostas estas sem diferenciais (ou sem tempo para serem apresentadas como isto) que se fossem exclusivamente o tópico debatido ali, deixariam o horário político mais chato do que já é.

Em uma eleição que descamba para chatice, para o medo de mexer com "quem não deve", mesmo que ele carregue um mar de poréns dignos de discussão, estes caras alimentam uma mínima vontade de parar pra ver a propaganda eleitoral. Aí nesse momento se levanta o inconformado e solta aquela máxima: "po, mas as pessoas deveriam se interessar por ele por outros motivos, e não pelo Ronaldo Ésper candidato".

Esse é aquele mesmo cara que fala "o esporte brasileiro não tem apoio, você vê alguma partida de handball na tv aberta?" e eu respondo, "meu amigo, você assistiria uma partida de handball na tv aberta?". Ou seja, o cara é o espelho do próprio problema. Um problema sistemático que não será mudado da noite para o dia, principalmente em um contexto global onde não se há causa para lutar. Por isso, amigão, fica a dica, não se indigne com o Tiririca ou com o Maguila. Eles não serão eleitos, fizeram seu dia mais feliz e te renderam uma twittada descolada. Afinal é sempre bom lembrar que você não esqueceu do Sérgio Mallandro candidato em 2008, mas provavelmente não se lembra de quem votou pra vereador naquele ano.

4 comentários:

  1. Assim como você, Caju, julgo bisonhas aquelas manifestações pseudo-intelectuais de "ah, essas bizarrices eleitorais!". Até porque, acho que as verdadeiras bizarrices são outras. Mas tentarei traçar uma análise não fanfarrona e 100% racional deste fenômeno fantástico que muito me interessa. Candidaturas como a do Tiririca são sinais dos novos tempos, reflexos claros do sucesso de um ex-metalúrgico que, muito antes de Obama, fez muita gente pensar: "Opa, peraí, porque eu, que vim debaixo, não posso chegar lá?". A questão é: uma vez "lá", o que fazer? Chegamos a um ponto em que temos de optar entre algo nulo ou algo muito pior. Ou seja: alguém - como o abestado - que se limita a dizer que "vai ajudar muita gente" (e que está sendo sincero, embora não tenha nenhuma proposta ou qualquer pensamento coletivo e nem tenha idéia do que vai enfrentar no Congresso. Em outras palavras, um cara que teve a dignidade de não mentir, mas não se preparou para nada e que se dará por satisfeito se for eleito) ou alguém (como 95% dos candidatos, inclusive os irmãos do KLB) que tem articulações com conhecidos "peixes grandes" da banda podre da política e que alega de maneira evasiva - e mentirosa - que vai defender alguma bandeira da moda (direitos dos gays, meio-ambiente) ou a velha tríade de promessas (saúde, educação e segurança). Como sabemos, esse segundo tipo de candidato também vai "ajudar muita gente" (e eu não estou falando de família e amigos de infância, se é que você me entende). Esse tipo de gente (KLB é o primeiro exemplo que eu consigo pensar) tá preparada pra fazer o pior serviço possível e servir a interesses dos mais escusos, e ser eleito vai ser apenas o primeiro passo. Entre esses dois, claro, fico com o primeiro. Mas será que não poderia haver uma terceira opção? Gostaria muito mesmo que o Tiririca tivesse capacidade de persuadir, contestar, enfim, poder de mobilização. Imagina isso, cara! Lula, por exemplo, tem isso e muito mais. Mas infelizmente, o nosso abestado é só mais um cara que fala: "eu também quero brincar disso. Entre eles lá e eu, melhor que seja eu". E com seu carisma, pode até chegar lá. Mas não vejo nele a capacidade de usar a mídia e os seus dons a favor de um bem coletivo, como um político de verdade tem que fazer. Por isso tudo, é uma triste caricatura de uma esperança que não se concretiza. Um desperdício.

    PS: falo isso tudo com base nas 2 (longas) entrevistas dele que eu li. Nelas, ele dava respostas curtas e vagas e, apesar de ter a chance, não citou uma ideia sequer.

    PS 2: antes que você pense que não, eu acho mais do que legítimo o direito de ele se candidatar. E da maneira mais engraçada possível. Mas você me conhece. Eu queria ver mais. Seria ainda mais genial se ele desmentisse meu pessimismo. Horário político não tem que necessariamente ser chato nem legal. Não me importo com a forma, mas o conteúdo tem que existir, né? Um Guia Legal Pra Caramba era isso. Ou não?

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  2. Parabéns pra mim, que fiz um comentário maior que seu texto. Mas, nem de longe, melhor.

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  3. E o Rôla foi um precursor. Um cara que se levantou contra o estabilishment e falou "Foda-se o status quo".

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  4. Sobre Tiririca e o que eu falei, veja uma das entrevistas. http://www1.folha.uol.com.br/poder/787678-nao-e-piada-e-a-realidade-diz-tiririca-sobre-slogan-de-campanha.shtml

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